...Agora me diz uma coisa, se o’cê ganhasse dinheiro que que o cê faria com esse dinheiro…
(ruído externo)
Eu ia compraaaa
alimentação e superalimentação
pra mim não (num) morrê de fome
Você tá morrendo de fome aqui?
Tô morrendo de fome
Não tem comida aqui o suficiente ...pra você?
É uma miserinha de nada,
uma miserinha à toa
É mesmo?
É...
Mas noutro dia eu vi o pessoal almoçando, um pra’tão cheio de comida…
não é não?
Ih, é...aquela, humm...pra poder uma...
Ter uma alimentação é preciso depender sempre...
de um (dum),
de uma (duma) fêmea,
dos filhos todinho(s) da fêmea,
dos bichos e dos animais todinho(s) da fêmea
É?
Recolher tudo, botar tudo pra dentro
pra fora pra cima pra baixo de um lado do outro pela frente pelo fundo pela boca pelo olhos pela cabeça pela pele pela carne pelo ossos ...pela larguez ...pelo larguez ...pela altura pelo corpo todo.
[PAUSA
LONGA]
Quem sofre sou eu
Quem passa mal sou eu…
Você ( cê) passa muito mal?
Passo mal
Porq….
Porque eu tomo constantemente injeções aqui n no frontal
Injeções para homem e o líquido desce
Comentário de Ariadne
Muitas dúvidas surgem no processo de transcrição: uma delas é sobre a marcação da oralidade, por exemplo ao se pronunciar os verbos - tanto Stella como as interlocutoras, muitas vezes, pronunciam o verbo com a vogal aberta, por exemplo “comprá” ao invés de “comprar”, penso que essas marcas da oralidade devemos preservar. Li que esse apagamento do [r] final tende a não depender da classe social e apresenta uma relação da estrutura do português no Brasil com as línguas africanas. Ponto que podemos, por exemplo, comentar em notas, até pedindo ajuda de linguistas, convidando alguns linguistas para escrever notas, nos ajudar na transcrição. Ainda nesse caminho de reflexão, fiquei, de fato, em dúvida como marcamos os traços de oralidade e acho que ler a discussão sobre os escritos de Carolina Maria de Jesus e até o debate que Conceição Evaristo faz sobre os traços orais em sua escrita e a questão racial pode ser um debate interessante. Além disso, percebo que o ato de transcrever vai exigindo da gente a reflexão sobre para qual gênero textual estamos transcrevendo e, talvez, “brincar”/”transpor” vários gêneros seja uma solução, pois Stella vai variando o modo de falar…